terça-feira, 31 de janeiro de 2012

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Hoje o Diablog traz no regaço, acalenta e encoraja uma querida amiga, que experimenta o que poderíamos chamar de "perturbação infeliz, tanto óbvia quanto não-essencial", que dá e passa.



Ato I

Quando vi

já tinha sido tragada pela avalanche
já tinha sido dobrada na onda gigante


o estrondo rouco e seco atordoando os ares
o terremoto fazendo ruir as bases


com a bala bem perdida me atingindo em cheio
ousei um último suspiro, impotente


Ato II

como num sonho louco beirando o improvável
o céu azul e límpido resfolegou em minha pegada
o sol, com suas vestes ondulantes de amornado
roçou meu desejar em novos arrepios
de cheiros vivos, densos e pulsantes
sem recender àqueles cinzas desbotados
dos jardins do Louco e do Idiota
de distantes paragens de um outrora
que nublou-se pedra e gelo no passado

                                                      (V.V.)



Ao levantar os olhos do livro, das linhas próximas, e ao deixar de vê-las
para contemplar a noite perfeita:
Oh! os sentimentos pressionados se dispersam quais estrelas,
como a fita de um maço
de flores desfeita.

Juventude suave, e severa, árdua indecisão,
ardores e arqueamentos delicados –
Por toda a parte o desejo de corresponder e em parte alguma a ambição;
Terra suficiente, mundo demasiado.

            (Rainer Maria Rilke, em tradução de Marco Lucchesi)



                    Cada lugarzinho tem
                     um canto escondido.
       Um ao meio-dia, um às três da tarde.
                    Cada passarinho tem
                    um canto exclusivo.
    Às vezes passa um carro, mas só às vezes.
     E as ondas do mar não param de passar.
                 Quem tem medo de cobra
                             põe sapato.
                    Quem não tem a mãe
                           obriga a pôr.
                O mormaço apazigua a cor.
             Às vezes chove, mas só às vezes.
          Estende a esteira para ver as estrelas.
               Sobre a areia deita-se também.
                          Tudo é cinema.
               Ninguém precisa de problema.

                        (Arnaldo Antunes)
                                                    









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