sobre o nome das coisas (para Luiz Ruffato)
I
porque todos os mistérios são santos,
não nomearemos o nome das
coisas.
ainda que os desertos floresçam
e o caos das chuvas transborde,
deles, o sangue não diremos.
II
no início era a Vida.
depois aprenderam os cães a ladrar
e o homem a chamar o nome das coisas
e os dedos a cruzar em nome de Deus.
III
ainda que encruado o Filho
ou mesmo que a serpente
renegue por 3 vezes
a árvore do desejo,
o nome não será.
ainda que lambam as chagas.
ainda que as lágrimas escorram,
toda a dor será cuspida
e o sol cumprido.
IV
quando caminhávamos na areia,
os nomes não havia.
havia o mar sem nome.
o céu, as frutas,
as pegadas dos pássaros
e o sonho havia sem nome.
tudo era simples.
simples os homens
sem nomes.
V
eram noites
e dias indefiníveis,
as coisas.
os olhos aprendiam o verde
e pescavam sem nomear.
os olhos ouviam tudo.
maravilhavam-se de
maravilhas!
VI
quem nos carrega nos ombros?
quem nossa língua nos bebe?
a quem dizer, quero?
a quem dizer, preciso?
a quem dizer, inocentes?
VII
as coisas que não diremos
habitam as cidades
e as sombras iluminam
escuras cavernas.
os dentes, os cabelos
arranca-nos, o tigre.
VIII
vivemos dentro de nós.
estrangeiros.
percorremos estradas,
ruas, cidades. nus e
estrangeiros.
cada sorriso, cada
abraço, estrangeiros.
nossos mares e navios,
estrangeiros.
IX
o Tempo se cola ao corpo.
o rosto envelhece.
unhas expurgam.
enruga a pele.
resta esperar.
X
quantas faces temos?
qual delas se chama
amor?
quem em nós se diz a
morte?
qual acende a vela do
templo?
XI
eis que
os nomes não ditos se esquivam
e o Verbo
que era barro
se faz
vento.
(Tanussi Cardoso)
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